terça-feira, 15 de abril de 2008

Homenagem a Mario Covas

SE ZUZA AINDA FOSSE VIVO


Ele foi amado e odiado, mas sem dúvida alguma foi um dos políticos mais respeitados do País. Eu diria que ainda o é. Sua herança política é de uma grandeza imensurável, de uma dignidade jamais vista no mundo político nacional.
Zuza fez da sua vida política um exemplo a ser seguido, mas, infelizmente, poucos homens públicos o fazem. De personalidade forte, jamais deixou sem resposta uma só falsa acusação que lhe fosse feita, provando por a + b seu caráter ilibado.
Cometeu erros como todo ser humano comete, mas jamais deixou de pensar que fazia o melhor para seu País e para seu Estado. Defensor inconteste da democracia teve seus direitos políticos cassados pelo AI5 durante dez longos anos sem, no entanto, deixar de batalhar nos bastidores da política nacional.
"Como acreditar que as Forças Armadas brasileiras, que foram defender em nome do povo brasileiro, em solo estrangeiro, a democracia; no mundo, colocassem como imperativo de sua sobrevivência o sacrifício da liberdade e da democracia no Brasil? Sou, senhor presidente, por fundamentação e por índole, um homem que mentalmente crê. Creio no regime democrático, que não se confunde com a anarquia, mas que em instante algum possa rotular ou mascarar a tirania. Creio no Parlamento, ainda que com suas demasias fraquezas, que só desaparecerão se o sustentarmos livre, soberano e independente”.
Esse discurso, proferido em 12 de Dezembro de 1968, em defesa de seu colega Marcio Moreira Alves, deu início ao processo que culminou na cassação de seus direitos políticos no ano seguinte.
Sua figura marcante, sua voz grave e seus ideais políticos fizeram dele um ícone ético em um mundo que começava a apresentar sinais do enfraquecimento no que se refere ao caráter dos homens públicos.
Mesmo nas adversidades jamais pensou em fazer uso de sua posição política. Também jamais posou de vítima para quem quer que fosse, uma vez que se orgulhava de ter lutado contra o regime militar e em prol da democracia por uma questão de opção. Tanto é verdade que, diferentemente de muitos outros militantes da mesma causa, em momento algum cogitou recorrer à famigerada lei de Anistia da qual tantos outros se beneficiaram pecuniariamente.
Foi eleito Senador com uma maior quantidade de votos jamais vista no Congresso Nacional (quando ainda podia ser assim denominado) com mais de 7 milhões de votos.
Zuza, apelido carinhoso dado por seu tio Mario e personagem deste artigo era nacionalmente conhecido como Mario Covas.
Em 1989, escolhido por seu partido como candidato a Presidência da República, em seu primeiro discurso de campanha mostrou em uma simples frase os ideais que tanto desejava para o Brasil: "Basta de gastar sem ter dinheiro. Basta de tanto subsídio, de tantos incentivos, de tantos privilégios sem justificativas ou utilidade comprovadas. Basta de empreguismo. Basta de cartórios. O Brasil não precisa apenas de um choque fiscal precisa também de um choque de capitalismo, um choque de livre iniciativa, sujeita riscos e a não apenas a prêmios”.

Mario Covas sempre foi um político capaz de frases marcantes e cobertas de razão, ética e dignidade. Em 1989, em plena campanha eleitoral, emitia sua opinião pessoal a respeito de diversos assuntos, opiniões estas que o levaram a ser derrotado no pleito do ano seguinte:

Privatização: "Há necessidade de privatização em alguns setores. Eu não privatizo, por exemplo, a Petrobras, pelo seu significado simbólico para a própria libertação da economia nacional".
Desigualdade: "Desigualdade não se corrige com estagnação. Corrige-se redistribuindo renda e crescendo ao mesmo tempo".

Impunidade e crescimento: "O problema fundamental é a impunidade, que criou um tipo de cultura que impede as pessoas de acreditarem na legalidade".

Corrupção: "É preciso acabar com o rouba, mas faz. Quem não rouba, faz mais".

Alguns podem até contestar essa singela homenagem ao homem público que, em minha opinião, é a imagem mais digna de todo o cenário político nacional e, um exemplo a ser seguido no resgate da dignidade da política como um todo.
Se Zuza fosse vivo, estaria empunhando a bandeira da ética, da honestidade e da dignidade, face ao estágio decadente da política que se é praticada atualmente e que tanto denigre a imagem do homem público. Estaria, sem dúvida alguma, batendo forte na conivência do Congresso Nacional para com os mandos e desmandos do Executivo, nos acordos e esquemas que só denigrem a imagem do homem público. Ao menos tentaria chamar de volta a razão nossos parlamentares, indicando-lhes o caminho perdido nestes últimos anos. O Legislativo legisla, o Executivo cumpre e, nunca o inverso, como têm ocorrido nos últimos anos.
Mas Zuza se foi em 07 de Março de 2001. Deixou como legado a ética, a honestidade e a luta pela democracia. Exemplos como o dele deveriam ser a regra e, nunca a exceção.
A grande decepção de Zuza veio no seu “pos-mortem”. Passados 7 anos de sua passagem, sua esposa, Dona Lila, entrou com um pedido de indenização junto a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, pleiteando o valor de R$ 4,7 milhões. O valor da reparação pedida foi calculado levando em conta o período em que Zuza permaneceu sem os seus direitos políticos. Segundo os cálculos dos advogados de dona Lilá, Zuza deixou de receber o equivalente a pouco mais de R$ 2,3 Milhões durante o período, sendo que o mesmo valor foi levantado a título do dano moral.
No entanto, de acordo com o Presidente da Comissão de Anistia, o exercício parlamentar não é considerado vínculo laboral e, portanto, o cálculo da indenização, se aprovada, não poderá ser feita sobre os vencimentos que deixou de receber como deputado federal cassado. Desta forma, o cálculo a ser efetuado atenderá ao disposto em texto legal, ou seja, o de 30 salários mínimos por cada ano de perseguição, algo em torno de R$ 120 Mil. O processo não tem data para entrar em pauta.
Se, em vida, Zuza jamais pensou em pleitear esse direito, o pedido de Dona Lilá soa como uma afronta ao símbolo, ao ícone Mario Covas. Ofende-lhe a memória e, com certeza, se Zuza fosse vivo, jamais aceitaria sequer discutir tal pretensão, pois a perseguição por ele sofrida, como afirmou diversas vezes, adveio, única e exclusivamente, de sua opção de luta pela democracia.

Independente do pedido de Dona Lila, muitas indenizações já foram dadas pela Comissão de Anistia e, mesmo sem entender os critérios adotados, muitos foram beneficiados. Entre eles Carlos Lamarca, desertor, guerrilheiro e homicida que, em nome de uma suposta democracia, travou, e perdeu, a luta armada que, como ele próprio sabia, era uma causa perdida e uma opção pessoal. Alguns políticos de renome também pleitearam e receberam indenizações por sua opção política à época. A bem da verdade não há mártires nesta página negra de nossa história, há sim opções pessoais, algumas fazendo uso das palavras, outros fazendo uso das armas e penalizando inocentes.
Melhor dizendo, se existem mártires, esses foram as vítimas inocentes causadas pelos ataques terroristas da época e, que a Lei de Anistia deixou fora de seu bojo, abandonando-os a própria sorte.

PS - Eu o vi apenas uma vez em público e não me orgulho nem um pouco da cena que vi. Foi em Sorocaba, quando na praça central daquela Cidade, encontrou a manifestação de professores e estudantes que se reuniram para se um feito contra o cinto apertado imposto pelo então Governador Mario Covas. Num desses rompantes insanos que aproximam os seres humanos dos animais, um manifestante, vestindo camiseta ostentando a estrela vermelha, se aproxima do homem-autoridade e, em um ato de desrespeito, seja pelo homem público, seja pelo ser humano (Covas já estava muito doente), desfere-lhe um tapa com a mão aberta, onde tinha um ovo. Covas, apesar de irritado, retirou o lenço do bolso, limpou o rosto indignado e seguiu em frente. O agressor foi detido e, segundo algumas fontes idôneas, Mario Covas pediu para falar em particular com o indivíduo para o qual disse: “Pode ficar tranqüilo que nada irá te acontecer, mas se eu não estivesse tão doente e tivesse uns 15 anos a menos, você teria que encarar, não o Governador, mas o homem Mario Covas”.
Diz a lenda que o rapaz começou a chorar, pediu perdão e se tornou um admirador inconteste do político e do homem Mario Covas, o ZUZA.

Takeyuti Ykeuti Filho

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